Asas Abertas celebra a diversidade cultural
Portela é uma família reunida, digo de cabeça erguida com grande satisfação. Estes versos de mestre Candeia foram reconfirmados durante o último Asas Abertas, realizado em 10 de novembro, em clima de festa ao celebrar o 3º Encontro dos Consulados portelenses e toda a diversidade cultural que pulsa em Madureira e, a cada ano, emana de lá para distâncias cada vez mais longas.
Um início de tarde quente, com direito a brisa na medida em que o sol foi baixando, tornou a quadra da Portela um dos lugares mais aprazíveis da cidade para quem queria comida boa, música de qualidade, respirando a cultura do samba que remonta aos tempos da Jaqueira ancestral que serviu de sombra aos portelenses de primeira hora.
O Asas Abertas começou com um debate relevante sobre esta diversidade cultural que a Portela abriga e pretende irradiar. Participaram pessoas de resistência como Ana Paula Ribeiro, que fez o lançamento de um DVD, acompanhado de um livreto colorido, que aborda questões como a diáspora africana, os valores civilizatórios, os orixás, as iabás, quintais, religiosidade e comida de matriz africana.
Ou o professor na UERJ Júlio Araújo Júnior, que lançou Direitos territoriais indígenas: uma interpretação intercultural, fruto da dissertação de mestrado e que oferece novos contornos à interpretação dos direitos territoriais indígenas. Para o autor, é necessário criar condições favoráveis a um diálogo efetivo com os grupos culturalmente diferenciados.
Também deram seus depoimentos dois vencedores do Projeto Por Telas, que levou o cinema para Madureira. O integrante do departamento Cultural Ygor Lioi fez um curta sobre seu tio, um jogador de futebol esquecido como tantos em nossa fábrica de sucessos imediatos (Um Craque Esquecido). Também falou Rozzi Brasil cujo filme Procuram-se Mulheres abordou a presença da mulher no samba.
Falaram ainda o presidente executivo Luis Carlos Magalhães e o presidente do Conselho Deliberativo, Fabio Pavão, ambos exaltando a diversidade da Portela como instituição e as contribuições que traz para a cultura muito além dos cada vez mais exíguos minutos de apresentação na Passarela do Samba na Marquês de Sapucaí.
Enquanto o debate se desenvolvia falando sobre as cozinheiras, a Feira das Yabás de Oswaldo Cruz, as baianas do acarajé e o samba carioca., os convivas degustavam as delícias da Tia Neide como pernil, sopa de ervilha e costela e também podiam provar o legítimo acarajé baiano, feito pelas mãos de Rosa Perdigão.
Mas conversa de sambista é samba e os grupos 7 na Roda-Consulado do Distrito Federal e o agrupamento do Rio Grande do Sul inundaram a quadra de alegria com sucessos do cancioneiro portelense. Desde o distante Teste ao Samba, o protótipo de samba-enredo criado por Paulo da Portela ainda em 1939, a exaltações mais recentes feitas por Monarco, Candeia, Casquinha e uma lista interminável. Ora sentiamo-nos em um terreiro, ora na Sapucaí, ora num boteco da Lapa.
Entre um set e outro, o Poesias de Asas Abertas teve sua segunda edição. Relatos fortes, de resistência, deixando mais do que clara a necessidade de reconectar a escola de samba com a favela de uma forma mais orgânica, completa e não apenas para formar alas de comunidade para o desfile.
Houve uma homenagem fundamental às raízes portelenses. A entrega da medalha Natal para o Mestre Bombeiro, um dos nossos diretores de bateria que formou, como ele mesmo se orgulha em dizer, diversos sucessores, inclusive nosso atual Nilo Sérgio. Entre suas saborosas histórias, como levar a Portela ao Itamaraty para se apresentar à realeza britânica, há a manutenção da batida distinta da Tabajara do Samba, uma obra que ele ajudou a preservar.
O final da tarde-noite ainda guardava duas gratas surpresas. As crianças chegaram com o sol alto ainda. Estavam deslumbradas naquele local que mais parecia pra elas um parque de diversões com aquela imensa Águia a dar-lhes boas vindas. Correram, brincaram e quando o sol já havia dado adeus, o grupo de Jongo Mirim Memórias do Cativeiro, de Barra do Piraí, desfilou canções ancestrais e a dança que serviu como uma das origens do samba carioca, sobretudo em Madueira. Era a transmissão de raízes culturais para uma nova geração que mostrou orgulhosa a força que a Portela tem.
O final da jornada foi com o mesmo Consulado do Vale do Café, responsável pela exibição do jongo mirim, com uma bateria tocando os sucessos carnavalescos da Portela como o imortal Contos de Areia, que também prestava tributo à mesma Clara Nunes que será cantada no Carnaval 2019.
Fomos todos pra casa com o coração batendo no ritmo das convenções de tamborins, nas canções em tom de lamento das crianças do jongo ou na malemolência portelense, seja ela expressa em versos de canção ou poesia. Era a Águia mais uma vez de Asas Abertas para seus filhos.
(Marcelo Hargreaves)
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